Picadas, dores generalizadas, “moinhas”, impressões, formigueiro… As dores e tensões musculares podem ter várias formas, e já foram várias as expressões de dor que eu presenciei no meu trabalho como Personal Trainer.
Eu sou apologista de que nenhuma dor do nosso corpo aparece por acaso. Existe sempre uma razão, uma fonte de stress, por detrás de cada sintoma físico que possamos sentir.
Wallwork et al. (2015), refere que a dor e tensão muscular excessiva gera uma alteração negativa no controlo e domínio do movimento, havendo assim um decréscimo na performance.
O nosso corpo funciona como um todo. Várias partes isoladas compõem todo um sistema musculoesquelético, tal como vários músicos compõem uma orquestra. Quando um determinado músculo está demasiado tenso, ou quando uma articulação não contribui para o movimento de forma adequada, os músculos e articulações mais próximos irão compensar esse défice. Isto significa que irão aumentar o seu nível de atividade, de modo a proteger o músculo ou articulação mais débil. Este aumento de atividade pode não ser proporcional àquilo que aquele músculo foi desenhado para fazer, resultando naquilo que se chama sobrecarga.
Quando um determinado músculo é levado ao limite desta forma, gera-se uma hipersensiblidade por parte do sistema nervoso e é criada uma mensagem sob a forma de dor, lesão ou perceção de ameaça, semelhante aos nossos antepassados na pré-história na presença de predadores, (Hodges & Smeets, 2015).
Quando esta sobrecarga é prolongada no tempo, ocorrerão adaptações por parte do sistema nervoso central, desencadeando alterações primeiramente subtis e posteriormente mais pronunciadas, as chamadas de dores crónicas com as quais uma grande percentagem da nossa população se conforma.
Estas alterações expressam-se através da redução da amplitude articular, rigidez muscular e atrofia. Isto porque o nosso sistema nervoso central, na presença de ameaça física, desencadeia mecanismos para reduzir o potencial de erro e lesão, imobilizando a zona de “perigo”.
O nosso corpo é fantástico! Mas como evitar estes processos?
A prática de exercício físico, mais uma vez, entra neste contexto. O treino, quando devidamente doseado e contextualizado, pode ser o responsável por aumentar a capacidade de resposta por parte do nosso corpo aos stresses físicos e emocionais do quotidiano.
Por isso mesmo é que não gosto da frase “no pain, no gain” que a indústria do Fitness tem vindo a proliferar nos últimos anos. A chave é estimularmos o nosso corpo para que ele se adapte em vez de se proteger! Porque, como já vimos, proteção leva a tensão, tensão leva a dor.
Criarmos um contexto fértil de forma a baixar as nossas sirenes e permitirmos o nosso corpo encontrar o caminho para o domínio das capacidades e redução da tensão é um dos segredos dos Deuses que muitas vezes é tapado pela necessidade premente de se vender treinos demasiado intensos e competitivos na indústria do Fitness.
Samuel Corredoura, Coordenador Regional da Exercise School de Lisboa, afirma que “a própria fadiga deve ser considerada como um output de proteção do sistema, que de certo modo despoleta uma sensação de perigo, sendo por isso necessário dosear muito bem os seus níveis. Mais cansaço após o treino não significa que se treinou melhor”
O treino de fortalecimento muscular, estabilização e foco/consciência, ajudam o cérebro a ter mais perceção dos músculos aos quais se conecta, e, deste modo, controlá-los melhor. Isto vem tudo do aumento da congruência entre aquilo que é uma mensagem do cérebro e a concretização da contração do músculo.
No campo psicossomático, existem também tensões musculares que advém de stress emocional. Cada um de nós expressa essas dores de forma diferente. Talvez uma caixa de eMails cheia coloque demasiado peso nos nossos ombros. Talvez uma discussão com um ente querido coloque tensão na nossa região lombar. Talvez o cansaço e desânimo façam com que o corpo acione dores nos joelhos, de modo a fazer-nos parar de correr (contra o tempo) e descansar.
Vários estudos apontam para as causas psicossomáticas como principal responsável por dor crónica nas populações entre os 25 e 55 anos.
Mais uma razão para aumentarmos o potencial de resposta do nosso corpo, para que este não expresse tanto desconforto perante as fontes externas de stress que por vezes são inevitáveis.
Imaginem o potencial que isto tem na prevenção de lesões e tensões musculares! Aprendermos a ter o máximo controlo voluntário no nosso sistema muscular, e assim ditarmos melhor a nossa qualidade de movimento… e de vida.
Tensão requer, de facto, muita atenção… e carinho! 🙂